terça-feira, 11 de março de 2014

No dia em que saí

saí verão e encontrei primavera. me banhei e perdi a escova. mas tudo bem, comi frango e chupei melancia. sai verão e se fez outono. o tênis de pano tá molhado e o pé bem gelado. não tem problema, hoje é sexta e tem cerveja. sai verão e esbarrei no inverno. passei frio e molhei o vestido roxo de fazenda. mas tudo certo, daqui a pouco tem abraço de ogro e tremoço gostoso.

sexta-feira, 7 de março de 2014

Post-it ou Constatações sobre nada importante

o frio deixa a gente pequeno
no céu, as estrelas ficam baixas
o aeroporto de madri é maior que araguari
o cachimbo é um cigarro aberto
manoel de barros constatou constatações
quantos fusos no meu coração
cotonete é a vassoura do ouvido
homens usam bolsa em lisboa
os post-it não tem graça sem você
foi portugal que fodeu tudo
a gente é ogro junto
o maçarico deixa a vida muito melhor
a gente se economiza
as vagas são efêmeras
meu amor faz cuecão em mim
a vida antes e depois do maçarico
mezencios e moacir, um casal kinder ovo
por que a embalagem da negresco é meio ice
ninguém quer mudar de marcha mais não!
sinusite é quando o cérebro derrete
ainda morro tentando ver a lua
um casal de elfos entrou
consegui colocar o pé no encosto
parece casa de puta em dia de faxina
all star é a chuva quem lava
a liberdade é verde. disse-me o sinal de transito
george é um macaquinho muito do esperto
tem brocal no mar

A arte de amanhecer



Às oito horas da manhã a vida ainda é mansa no centro da cidade. As lojas aos poucos abrem suas portas e acendem suas luzes; os vendedores ainda estão lentos e vagarosos no compasso da manhã. Ainda não anseiam por clientes e o sorriso ainda se esconde nos incessantes bocejos. Da janela do ônibus vejo alguém digitar ao celular, um homem comum testar um binóculo pequenino e outra que carrega em sua bolsa de pano cru um abajur lilás.

Tantas vidas transformadas numa só. São só estranhos compondo o quadro do dia. Figurantes atuando na história da sua vida ou na história que está dentro da sua cabeça, quando a sua cabeça está cheia de nada. Pela perspectiva oposta, somos figurantes da vida dos outros, da história de seres completamente desconhecidos. Mas às oito horas da manhã as pessoas ainda se conhecem e ainda acham tempo para atuarem melhor.

A manhã é assim até no centro da cidade. Lenta, serena, frescamente preguiçosa. As mercadorias vão chegando, as vitrines se montando e as pessoas vagarosamente vão chegando. Às oito da manhã ainda tem sorriso no rosto e cara lavada, ainda tem gentileza e não tem buzina. Às oito da manhã tem até vaga pra estacionar e lugar no coletivo pra sentar.

Às oito horas da manhã, ainda existe esperança e vontade de mudar o mundo. Talvez os protestos tivessem um melhor êxito se começassem às oito horas da manhã.

Às oito horas da manhã não há sorvete, mas há fruta fresca, feira e suco natural. Tem piqui direto da roça vendido no carrinho de mão e dependendo da época tem jabuticaba, cereja e melão doce. Não tem refrigerante, mas tem caldo de cana e pastel de vento. Vento. Às oito horas da manhã não tem vento que venta tanto, tem brisa que refresca e arrepia os pelinhos do braço e faz rir.

Às oito horas da manhã a vida está prestes a começar. É a linha tênue entre o fim dos últimos segundos de vida fresca e o início do horário comercial e toda a loucura que por ele vem acompanhado. É como olhar a vida em câmera lenta e conseguir degustar cada centímetro de história, cada simples sensação. Os sentidos ainda estão lentos, mas nem por isso menos aguçado. O cheiro de café paira nas calçadas, provenientes das belas padarias que exibem seus pães corados, suas broas amarelinhas e sua bonachice de serem padarias de esquina.

Às oito horas da manhã é o último momento de comprar o jornal enquanto ele ainda está dobradinho e lisinho. Seu papel parece ainda gelado de sua entrega ainda na madrugada. Jornal com cheiro de noite só no máximo até às oito horas da manhã. Nada como um jornal firme para acompanhar o último café fresco da padaria bonachona da esquina.

Também é o último momento de se contemplar o sono do centro da cidade. Suas ruas vazias e ainda limpas, suas calçadas nuas, suas portas vazias. É mais fácil ver a cor da cidade quando não há gente para se misturar com as tintas. Às vezes a gente mancha a pintura do centro da cidade ao querer dar movimento a ele.

Às oito horas ainda há bom humor e quase não há troco, recomenda-se usar cartão, no débito. Às oito horas da manhã a cidade me pareceu acolhedora e por alguns minutos, enquanto a linha A119 passava pelo centro da cidade, tive a impressão que tudo daria certo. Ainda há otimismo às oito horas da manhã ou talvez fosse só o fato de estar saindo da rotina de fazer o mesmo caminho para chegar ao escritório monótono de sempre. Ou talvez fosse só o tempo o tempo fresco que ainda não havia fritado meus miolos ou  talvez mesmo, fosse o fato de ainda não chegado ao terminal central que já não é mais leve às oito horas da manhã.