quarta-feira, 25 de junho de 2014

Polishop Transcendental



A gente corta o cabelo por que ele cresce, e de repente começa a cutucar seu olho, sua orelha, sua nuca. É visível que ele cresceu. Nada que uma boa tesoura não resolva - Mas se você não tiver intimidade com esses processos, é só achar um cabeleireiro mais próximo, ou marcar hora com aquele já velho conhecido de suas aventuras capilares. Da mesma forma a gente corta as unhas, como eu fiz agora mesmo, antes de começar essa bobagem toda. A cebolinha cresce demais, a gente poda. O pé de cidreira começa a entrar no vizinho, a gente corta algumas ramas fora. Assim, tudo simples como parece. Mas e quando a vida de dentro da gente cresce? Ou ao menos quer crescer? Como faz produção? Quando seus novos objetivos transbordam para fora da vida que se tem e tudo começa a parecer pequeno, apesar de tamanho progresso municipal. As noções de pequeno e grande, parecem distorcidas se me olho anos atrás. O grandioso torna-se o necessário. A fartura torna-se a humildade da terra que solene, nos alimenta. A beleza vem da natureza pura, contemplada. Do silêncio de prece ao acordar pela manhã, como agradecimento pela força do trabalho e como serva da natureza      que me acolhe em seu espaço. E quando o pé da gente cresce, a gente sabe por que o pé dói e o tênis aperta. Fica fácil entender que é preciso comprar um tênis com numeração maior e dar embora o antigo que não serve mais. Assim vai até a gente parar de crescer. Perde calça, blusa, aquela jaqueta legal, aquele sapato surrado amarelo que você pintou. Perde roupa de cama quando troca o colchão de solteiro pelo de casal. Perde o número de telefone quando muda de cidade. Mas aí, compra outro chip e logo tem um número novo. Simples assim como parece, mesmo por que hoje, um chip, custa dez reais. Barato até pra mim – apesar de até hoje não ter comprado um chip da ctbc. Enfim. Mas é simples assim. Na banca ao lado você compra por dez reais um chip que lhe promete dar acesso a um mundo inteiro, virtual. Uau. Mas em que site eu entro então, pra saber qual produto comprar quando a vida começar a pedir para renascer. Aceita boleto? Por que eu não tenho cartão de crédito. Mas ao ligar para o centro de atendimento, entro numa teia de gerúndios e teclas a apertar que não consigo obter informações. Tempos atrás foram necessários três técnicos diferentes e três inspeções diferentes pelas entranhas do prédio, para que um ultimo ao abrir apenas uma caixinha no corredor do quinto andar, me dissesse com toda a educação que não havia instalações para o serviço contratado. Agora penso eu, quantos técnicos e quantas visitas agendadas pelo 0800 devo eu fazer para saber se as fiações da minha central de inteligência estão mesmo precisando de um update, uma vez que o sistema operacional está ficando obsoleto ou se são apenas vírus e cavalos de tróia que circulam pelas fibras óticas emaranhando as guias e janelas que passam sem parar pela tela, pela janela, eu vejo tudo enquadrado, remoto controle. Não há mais tempo para pensar.  Desculpem a abrupta interrupção de pensamentos tão profundos e tão difusos, mas enquanto permaneço nesse sistema operacional atual, há as obrigações meus caros. E eu meus caros colegas, que passo por tamanho entrave existencial, questionando a forma de viver atual, questionando o crescimento desordenado das cidades estúpidas e a forma educacional rígida e decadente, devo ensinar pequenos seres a serem melhores. Mas o que é ser melhor? Eis o paradoxo da licenciatura que não larga do meu pé.                                                  

sexta-feira, 20 de junho de 2014

Vai viver vagabundo



Andei sumida e muito ausente. Perdoem-me, estava a viver por aí. Às vezes é necessário deixar tudo de lado e simplesmente ser o dia-a-dia.  Claro que nem tudo pode ser abandonado, o trabalho continua firme e diário e necessário para manter a cabeça ocupada o tempo necessário para se meditar, ter boas ideias, testar novas receitas e canalizar energia para as conquistas que virão. Quando não se está no trabalho a vida precisa não pensar em outra coisa a não ser estar no aqui e agora. Uma cerveja de repente, um feriado no meio da semana, uma noite em volta da fogueira, ter coragem de finalmente tocar numa cobra mini e bem simpática, cor de cobre.
Noutros dias, é dia de se esticar no chão e alongar o corpo que pede descanso e relaxamento. Medita e reaprende a respirar enquanto faz exercícios para relaxar a coluna que sofre a sustentação diária do ser orgânico e do ser pensante, que pensa tanto e só não pensa por que tanto pensa, para quem sabe tentar parar de pensar demais em coisas que nem precisam de tantos pensamentos assim. Sim, complicar sem notar e depois passar a vida toda tentando descobrir uma maneira de se descomplicar e tornar a vida mais leve. Osho disse que o ser humano perde a espontaneidade e a leveza do ser criança, para que possa amadurecer na vida, e que nosso amadurecimento é simplesmente a tentativa de recuperarmos a leveza perdida. A criança não pensa por que está feliz, ela simplesmente está feliz, pois ela simplesmente é, e simplesmente sente a vida vivendo.
Tem semanas que finjo não lembrar quantas coisas precisam ser escritas, quantos e-mails importantes precisam ser enviados, quantos assuntos precisam ser pesquisados. Os exames que precisam ser retirados, as consultas a serem marcadas, o controle do portão que é preciso encomendar, os papéis que precisam ser separados e jogados no reciclável, as receitas a serem pesquisadas e testadas, o mestrado, os artigos, o currículo lattes, a nova ideia que precisa ser discutida, a viagem tão querida de Julho, e a de Setembro? Fazemos rifa? Vendemos doces? Ainda sem resposta do espaço para continuar o novo projeto. Ah e esse novo projeto, será que rola mesmo? Não seria hora de fazer algo diferente e arriscar um pouco? Esquece tudo, põe roupa de frio e segue a estrada de terra ouvindo Neil Young e gritando seu sotaque caipira com toda força dos pulmões. Harvest Moon ganhou nova memória graças a você, que vestido de macacão e camiseta do Pequeno Príncipe, gritava a música junto comigo e o com o Neil, é claro. Saímos com a mesma cor esse dia e nem notamos.
Em outras ocasiões é necessário ser radical e dar-se um tempo, apesar de ser necessário visitar a família ou os amigos, ou prestigiar um amigo no palco. Ficar só é ouvir-se, contemplar-se por dentro e entender-se um pouco mais. Dar-se tempo para distanciar-se dos problemas e descobrir soluções. Às vezes precisamos ficar só, justamente para por em prática as soluções encontradas para um novo caminho. Um caminho mais ameno e mais calmo.
Aos poucos, o que agora ainda é tão difícil, vai se tornando parte da rotina e perdendo o peso da disciplina e do barulho dos despertadores e lembretes, que são ativados para tentar quebrar a osmose da comodidade emocional e mental. Mas pra isso é necessário tempo.
Estava lendo sobre meditação e li uma frase que me tocou apesar de simples e bem direta. Ela dizia que devemos meditar pelo menos 20 minutos por dia e que se por acaso estivermos sem tempo por causa da correria louca da rotina atual, nesse caso seria necessário, então, meditar pelo menos 40 minutos por dia. Nem sempre é fácil ficar a sós consigo mesmo, num quarto vazio e em silêncio absoluto, sem deixar nenhum pensamento fisgar sua atenção e energia. Mas só assim olhamos nos olhos nossos demônios e nos tornamos fortes para enfrenta-lo.
Dizem os terapeutas e psiquiatras que a melhor maneira de acabar com uma fobia é encarando a dita. Descobri recentemente que ando com medo da vida, então preciso vive-la.  Quanto a fobia dos telefones, também vou enfrenta-los e tentarei atende-los sempre que possível.  Mas por enquanto o celular continua no modo silencioso. Afinal, um passo de cada vez.